Falta de segurança jurídica afeta o setor no País

Entra ano sai ano, embora o setor extrativo mineral bata recorde atrás de recorde, os investimentos em pesquisa minerária ainda ficam aquém das necessidades e do potencial do território brasileiro, pouco conhecido em termos geológicos. A falta de regulamentação e orientação claras para a atividade e a consequente baixa segurança jurídica estão entre os principais entraves ao desenvolvimento de novos projetos.

As projeções do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) dão conta de cifras de US$ 50,4 bilhões em investimentos entre 2023 e 2027, sendo US$ 11,4 bilhões a serem realizados em Minas Gerais. Ainda assim, o volume destinado à pesquisa não acompanha a pujança do setor nem os aportes bilionários realizados todos os anos.

Tanto que a entidade lançou, no ano passado, uma publicação intitulada “Políticas Públicas para a Indústria Mineral” destacando os desafios a serem superados pelo Brasil para uma mineração cada vez mais evoluída e que gere contribuições ao desenvolvimento do País. Dentre os principais pontos estão o fortalecimento do orçamento da Agência Nacional de Mineração (ANM) e o incentivo à pesquisa geológica em escala mais detalhada, por exemplo.

De maneira complementar, o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa Mineral (ABPM), Luís Maurício Ferraiuoli Azevedo, lembra que, historicamente, a pesquisa mineral no País é financiada por investidores internacionais e que tanto o atual cenário econômico mundial quanto o nacional não favorecem essa atração.

“A América do Sul como um todo tem enfrentado certa desertificação na atratividade de investimentos. Questões como insegurança jurídica e morosidade dos processos têm levado os investidores a optarem por alocar os recursos em seus próprios países de origem. O risco político causado pela guerra entre Rússia e Ucrânia, por exemplo, poderia beneficiar o Brasil na atração desse capital, mas isso não tem acontecido”, avalia.

Conforme Azevedo, também pesam contra o Brasil o próprio perfil da produção mineral e o papel das instituições. Apesar de o País ser grande produtor, o foco não está nos chamados minerais do futuro como níquel, lítio, cobre, cobalto, grafite ou platinoides. “São eles que ditam o futuro rumo à economia verde e de baixo carbono e o Brasil, mais uma vez, não se apresenta como alternativa e não consegue atrair esse capital. Sem contar que as instituições ainda são muito precárias”, diz.

Morosidade na análise de projetos de pesquisas minerárias atrapalha setor

O melhor exemplo, segundo o presidente da ABPM diz respeito ao volume de pedidos de lavras em análiseProjetos que poderiam estar prestes a gerar emprego, tributo e renda, mas que não passam pelo crivo por falta de preparo, recursos e pessoal da Agência Nacional de Mineração (ANM).

Dados da entidade revelam que o número de pedidos protocolizados, incluindo requerimentos de pesquisa, licenciamento, lavra garimpeira e extração, somaram 14.410 em 2022. Já em 2021 esse número foi de 16.946. Os alvarás de pesquisa publicados chegaram a 9.732 no ano passado e 10.098 um ano antes. Foram apenas 1.510 relatórios de pesquisa aprovados em 2022 e 1.654 em 2021. E a as concessões de lavra outorgadas 661 e 760, respectivamente.

São mais projetos esperando ser analisados do que minas implantadas. Milhares de relatórios de pesquisa apresentados esperando a agência dizer que estão aprovados para mudarem de fase. No que isso impacta? O investidor não vai sair do país dele para investir US$ 1 milhão numa mina no Brasil, que vai demorar quase dez anos para entrar em operação. O excesso de burocracia injustificada afugenta esses investidores. A ANM não tem pessoal, não tem recursos nem meios para dar conta de suas obrigações”, denuncia.

O que diz a ANM

Procurada, a agência reguladora confirmou a situação à reportagem. Por meio de nota disse que apesar de ser a segunda agência reguladora que mais arrecada no País, é a penúltima em orçamento. E que vem sofrendo com constantes cortes e bloqueios de dotação orçamentária, que se demonstra insuficiente para alavancar sua atuação, principalmente na área de tecnologia da informação.

O orçamento contingenciado é da ordem de 90% do que deveria ser repassado para a agência conforme previsão legal (7% da Cfem, além das demais receitas, como taxas, multa e emolumentos). O órgão ressaltou ainda que o número de servidores alcançou um pico em 2010, totalizando 1.196 e, que atualmente, está em 664.

Por fim, disse que a situação crítica da ANM foi reconhecida pelo TCU, CGU, MPF, OCDE e pelo Gabinete de Transição do novo governo. E que os órgãos de controle já se manifestaram sobre a necessidade de nivelar a remuneração das carreiras da ANM para diminuir a evasão de servidores.

Para o presidente da ABPM, além das revisões junto à agência reguladora, outros pontos devem ser trabalhados a fim de modificar o cenário da pesquisa mineral no País. A começar por uma nova discussão do licenciamento ambiental e a adoção de leis que atendam toda a plenitude das demandas da sociedade.

“Não podemos apenas dizer que não queremos barragens ou mineração. Os acidentes ocorreram e foram seríssimos. Aprendemos com eles e criamos mecanismos. Nem tudo na mineração é ruim. Temos que aperfeiçoar as instituições e lembrar que nossa lei é boa e suficiente e precisa ser aprimorada, não mudada. Temos um código de mineração que inspirou o código de vários outros países. O problema é a conjuntura que não dá meios à agência de atuar com o mínimo de dignidade, frequência e transparência que o setor demanda e precisa. A mineração não pode estar no século XXI e a ANM no XIX”, conclui.

Fonte: Diário do Comércio
https://diariodocomercio.com.br/economia/falta-de-seguranca-juridica-afeta-o-setor-no-pais/

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